Deixei o povo na praça e voltei pra fila, resolvi encara - lá antes que mais gente chega-se, não demorou muito (cerca de duas horas e meia), estava já bem perto da escadaria do Palácio, que mais parecia arquibancada de futebol, me sentei ao lado de um velho acompanhado de uma moça, perguntei por que não entrava direto dada a sua idade avançada, ao que me responde o mal educado: “-- Velho é seu avô!” A moça riu e repreendeu o mal humorado, depois de pouco tempo, alguns degraus acima, o velho rabugento me pergunta se conhecia o Doutor Zé (pergunta tola) e por que estava ali, fiz de conta que não era comigo, levei uma bengalada na cabeça que fez galo e o pior, não podia nem brigar com o velho doido. Entre o galo na cabeça e o caixão foram outros quarenta minutos, já na porta eu entendi por que demorava tanto, todo mundo que ia contava uma (to sendo tão bonzinho, uma!) história do Doutor Zé, algumas até bem engraçadas e outras muito comoventes, o velho doido se chamava Luciano, era como se fosse irmão do Doutor Zé, tinha sido compadre e amigo quase que a vida inteira, o velho resmungão foi contar como o Doutor Zé ajudou o filho dele a nascer.
Que o Doutor Zé era gente fina todo mundo já sabia, era o padrinho perfeito, mas o primeiro afilhado foi o filho do velho doido (seu Luciano Pereira), que também era funcionário do Tribunal na época do Doutor Zé, naquele tempo não tinha muito isso de levar mulher buchuda pra hospital na hora do filho nascer, era o padrinho que ia buscar a parteira no quinto dos infernos, rezando pra mulher não ter ido atender outra buchuda, mas nesse dia o Doutor Zé tava sem sorte (nesse tempo não tinha carro e nem telefone), tinha de ir atrás da parteira de bicicleta, foi na casa de duas e não conseguiu nada, com a indicação da terceira, que era certeza estar em casa, foi no rumo da periferia (isso é bem longe) no encalço de Dona Miudinha, ao chegar a boa noticia a parteira tava em casa, entrou e esperou um pouco, aflito e nervoso queria logo botar Dona Miudinha na garupa e seguir caminho no rumo da casa do compadre Luciano, ao que aparece na porta a singela senhora (1,65cm de altura e 109kg) que mas parecia um tatu, Doutor Zé que nessa época era magrinho feito um pau de sebo, carregou Dona Miudinha na garupa quase duas horas, colocando os bofes pra fora, parecia um burro de carga urrando a cada pedalada. Enfim chegaram e Dona Miudinha ajudou o menino a nascer (batizaram o podre de Ermenegildo) e foi uma festa só, no meio dos abraços e da folia, Doutor Zé pegou o afilhado no colo, sem jeito parecia que ia derrubar o pequeno no chão, quando chega perto Dona Miudinha, dizendo: -- “Vamo seu menino, que amanhã tenho de acordar cedo!” Doutor Zé olha a senhora (imagine a Dona Miudinha) e lhe pergunta se ela sabe andar de bicicleta, ela diz que sim, ao que Doutor Zé dá a bicicleta de presente como agradecimento por ter ajudado a nascer o afilhado. Todos na sala riram e o velho rabugento com um sorriso no rosto olha o amigo e diz: -- “Besta, eu tinha levado a gorda mas não tinha dado a bicicleta!”


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